Adicional de 25% para aposentados por invalidez: pirâmide de Kelsen e reflexões sobre a dignidade da pessoa humana e isonomia.
Data: 14/08/2020
Autor: Martina Catini Trombeta
A lei previdenciária (Lei 8.213/91, artigo 45) estabelece que os aposentados por invalidez que necessitem da assistência de terceiros têm direito a um adicional de 25% no valor de seu benefício, mesmo que o valor ultrapasse o teto pago pelo INSS.
Como podemos observar, a letra da lei é específica em conceder o acréscimo apenas aos aposentados por invalidez.
Pode-se notar que os demais segurados aposentados, sejam eles por tempo de contribuição, por idade, dentre outras modalidades de aposentadoria, não estão protegidos pela legislação.
E ainda que necessitem da ajuda de terceiros, não terão direito ao tal acréscimo de 25%.
A garantia oferecida pelo legislador acaba ferindo o direito à saúde, vida, integridade física dos demais segurados, por uma afronta a igualdade de tratamento àqueles que se encontram em situação de incapacidade física.
O espirito da lei é proteger aqueles segurados acometidos por uma grande invalidez, e não gerar situações de desigualdade devido ao enquadramento em uma modalidade de benefício.
As pessoas aposentadas que se encontram em condições de invalidez e que não possuem condições de ter uma vida digna sem a ajuda de alguém, seja para tomar um banho, se alimentar, locomover, ir ao médico, realizar as afazeres diárias ou mesmo que seja para atividades de lazer de um simples de lazer, deveriam estar protegidas pelo adicional.
Com o avançar da idade, é muito comum que pessoas que se aposentaram em outras modalidades que não a aposentadoria por invalidez se tornarem dependentes de outras pessoas, o que os coloca nas mesmas condições de dependência de terceiros.
E o orçamento escasso, somados a ausência de condições de trabalhar desses segurados acabam os deixando extremamente vulneráveis e muitas vezes em condições de miserabilidade.
É justamente nesse ponto que verificamos que o preciosismo legal pecou, gerando inúmeras situações em que os direitos fundamentais e socias são lesados, pela não concessão do adicional aos segurados que não são beneficiários da aposentadoria por invalidez.
Além da necessidade da contratação de terceiros, muitas das vezes os custos com a invalidez podem levar a necessidade da aquisição de equipamentos especiais, de cadeiras de rodas, custos com sessões de fisioterapias, medicamentos não fornecidos pelo sistema público de saúde, custos adicionais com produtos de limpeza além de números outros custos com tratamentos que demandam orçamentos altíssimos e que não são oferecidos pelo Estado.
São comuns os pedidos administrativos e judiciais dos aposentados de outras modalidades de aposentadoria, que não a invalidez, para a concessão do acréscimo de 25%. Porém não concessão d acréscimo solicitado é uma realidade que se baseia na redação da lei.
Mesmo que haja base legal para fundamentar a não concessão do adicional às margens da lei, não podemos nos esquecer que a Constituição Federal possui preceitos e princípios norteadores do nosso ordenamento jurídico.
Considerando que as demais leis estão abaixo da Constituição, e que todas devem estar em coerência com aquelas que estão acima, nos valemos da pirâmide de Kelsen para explicar a razão pela qual é inaceitável a restrição imposta pelo artigo 45 da L. 8213/91.
Para uma boa compreensão da teoria acima construída, e que necessariamente exige o entendimento no nosso Direito Constitucional é necessário que sejam feitos alguns esclarecimentos acerca da hierarquia das normas.
Nos pautamos naquilo que os nossos juristas denominam “pirâmide de Kelsen”. A pirâmide, que leva o nome do jurista Austríaco que a construiu, baseia-se na ideia de que as normas jurídicas inferiores (normas fundadas) retiram o fundamento da validade das normas jurídicas superiores (normas fundantes).
Nesse sentido, a pirâmide de kelseniana aloca a Constituição em seu vértice (topo), sendo o fundamento de validade de todas as demais normas do sistema. Dessa forma, nenhuma norma do ordenamento jurídico pode contrariar a Constituição, que é superior a todas as demais normas jurídicas.
Todas as normas que estão abaixo da constituição, são denominadas infraconstitucionais. Em nossa Constituição, existem normas constitucionais originárias e normas constitucionais derivadas.
As normas constitucionais originárias derivam do Poder Constituinte Originário (quando se elabora uma nova constituição), e elas integram o texto constituição desde a sua criação.
Por sua vez, as normas constitucionais derivadas são aquelas que resultam da manifestação do Poder Constituinte Derivado (o poder que altera a Constituição). Nesse caso, temos as denominadas emendas constitucionais, que assim como as normas originarias, encontram-se no topo da pirâmide de Kelsen.
Com essa linha de raciocínio, os subsídios que fundamentam a extensão do direito ao adicional de 25% a todos os aposentados que se encontram em condições de invalidez, tem por base os direitos fundamentais e sociais previstos em nossa Constituição Federal.
Admitir o tratamento desigual aos demais segurados aposentados que se encontram na mesma condição de invalidez pautados em preceitos infraconstitucionais consiste em uma afronta a dignidade da pessoa humana e do princípio da isonomia garantidos pela Constituição.
Referências bibliográficas
SANTOS, Marisa Ferreira. Direito Previdenciário Esquematizado. 6ª ed. São Paulo: Saraiva, 2016.
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KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito, Martins Fontes, São Paulo, 1987.
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo, Malheiros, São Paulo, 2006.
Supremo Tribunal Federal. Noticias. Disponível em http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=449283 , consultado em 11/08/2020.